terça-feira, 21 de junho de 2011

Eterna Mercedes


A cantora e estudiosa da música popular chilena Violeta Parra morreu antes da ditadura de Augusto Pinochet. Mas o general tentou matar sua obra destruindo o museu criado por ela para o registro da música folclórica do Chile e exilando os principais grupos que gravaram suas canções. Também foram os agentes de Pinochet que assassinaram o compositor Victor Jara, uma espécie de Chico Buarque chileno, nos anos de 1970.
 

 
Foi naquela imensa noite das ditaduras que cobriam toda a América Latina que apareceu a voz gigante como a Cordilheira dos Andes, da cantora argentina, com fisionomia indígena Mercedes Sosa. Seu canto vinha das entranhas das terras peruanas, bolivianas e argentinas e era uma navalha, feita de ternura e raça que dava vida novamente às músicas de Violeta Parra e Victor Jara.

Mercedes cantava tudo que as ditaduras negavam. Mesmo as canções de amor pareciam hinos de luta na sua voz. Não somos fracos, nossa luta tem séculos, nossa luta vai ganhar, nos dizia sua voz ancestral. A ditadura Argentina, que já havia proibido Carlos Gardel e a física do socialista Albert Einstein e, também proibiu o canto de Mercedes. Ela foi para o exílio, mas foi pior para os ditadores. Sua voz, os seus discos e sua presença se espalharam pelo mundo, que ficou sabendo que na Argentina não havia apenas o tango. 

A cantora americana Joan Baez, de origem mexicana, gravou “Gracias a la vida” e “Recuerdo Amanda” e, dentro do próprio “Istazunidos”, patrocinador das ditaduras, a música de Violeta Parra tocava. Mercedes, que amava o Brasil, gravou com Chico Buarque e Milton Nascimento. “Volver a los 17” é uma obra prima. Gravou com Silvio Rodriguez, de Cuba. Mercedes cantava Che Guevara na música “Hasta la Victoria”. Nela, Che é Ramon, seu nome de guerra na Bolívia. Ela cantava os índios, os trabalhadores, as crianças de rua, a luta pela terra. 

Com a queda das ditaduras, a cultura yuppie e o neliberalismo tomaram conta da mídia, pregando “sexo, drogas e rock and rool” e lançando as sementes do choque de gestão. Mercedes Sosa foi para o limbo. Alguns tolos da objetividade a rotularam como uma cantora de protesto e fora de moda. Mercedes não se calou e nem vendeu seus ideais para voltar a tocar no rádio ou fazer propaganda de celulares. Continuou índia, sandinista, socialista e mãe da Praça de Maio. 

No dia 04 de outubro de 2009, quatro dias antes do aniversário de Che, a doença fez o que a ditadura e o neoliberalismo não conseguiram: calar Mercedes. Só nos resta dizer agora, ouvindo seus discos, “Duerme, duerme, negrita”.


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